17.7.02

O BOM MENINO VAI AO CIRCO DO CAREQUINHA



A campanhia de um Teatro João Caetano com menos da metade da lotação tocou pela última vez avisando o início do espetáculo. Atlas, o mestre de cerimônia, deu as boas vindas aos papais e mamães que trouxeram suas crianças para conhecerem um dos maiores palhaços brasileiros de todos os tempos, Carequinha, no raiar de seus 87 anos. Sim, foram os pais, fãs do palhaço, que levaram seus filhos. Fica difícil imaginar a criancinha pedindo "papai, me leva pra ver o Carequinha!".

Carequinha é esperto. Sem fôlego prum espetáculo inteiro ele juntou uns artistas circenses mulambentos que em nenhum momento ofuscam a sua figura. O primeiro a entrar em cena é o "rei do laço", que apesar da alcunha tropeçou na corda num de seus números entediantes. Ele segue à risca a filosifia de Nietzsche ("Vai encontrar uma mulher? Não esqueça de levar um chicote") ao arrancar com uma chicotada um cigarro da boca da ajudante. Por sinal, a ajudante que exibia suas celulites num shortinho preto parecia ter sido recrutada entre as putas que fazem ponto na praça Tiradentes, em frente ao teatro.

O espetáculo seguiu com o ventríloco, que provavelmente sem verba para adquirir um boneco de madeira usa um urso de pelúcia. Finalmente chega a vez do Carequinha. Ele diz estar preocupado com sua mãe de 112 anos, que havia saído pra comprar mingau pra avó dela e não tinha voltado pra casa. Muito irônico esse Carequinha. Anuncia o salto mortal, mas na hora H um palhaço anão chega por trás e dá uma paulada na bunda dele. Ainda bem. Se desse o tal salto, era capaz do Carequinha cair direto no caixão.

"Quem é que gosta da mamãe levanta o dedo? E do papai? E do Brasil?", Carequinha pergunta, como sempre. Todo mundo levanta a mão e ele emenda: "Quem faz xixi na cama levanta o dedo?". Algumas criancinhas incautas, como sempre, caem na brincadeira. Muito sacana esse Carequinha. O ventríloco volta, agora como mágico. Ele chama um garoto pra fazer aquele truque constrangedor da cueca. Passei por isso na minha infância e sei como é o nervosismo de ter a cueca mostrada para o público. Dois lenços são colocados dentro da calça do guri e depois de muita expectativa são puxados, com uma cueca amarrada. É claro que era OUTRA cueca.

Uma menininha de 5, 6 anos fantasiada de Carequinha entra no palco. É a Karequita, a provável substituta finalmente encontrada pelo palhaço, já que nenhum de seus filhos quis pintar a cara. Pelo menos, se a experiência no circo não der certo, ela poderá explorar outros dotes artísticos, dependendo de sua evolução. Já pensou uma palhaça na Playboy? "Descabele o palhaço com Karequita", seria a chamada da revista.

Quase no final do show, Carequinha anuncia que mesmo não sentido nem dor de barriga ele vai se retirar dos palcos no final do ano. É hora de cantar: "Chegou a hora de apagar a velinha / Vamos cantar, aquela musiquinha / Parabéns, parabéns, pelo seu aniversário". Fim de espetáculo, o palhaço recebe os fãs na rua. Fotos, beijos, abraços, autógrafos. Um coroa diz que veio de São Paulo com a família só para ver o circo. Uma dupla bizarra se destacava. Um, ostantava um mulet, e outro, com um jeitão de Mister Bean, segurava um LP compacto do palhaço. Antes de ser levado para fazer outro show em Volta Redonda, Carequinha autografou o meu CD. Muito foda esse Carequinha.