24.10.03

Grande notícia: o canto dos cisne do Afonso Brazza será finalizado e vai passar no Festival de Brasília. Imperdível!

Como Santhion, Afonso Brazza nunca morre

Afonso Brazza não tinha a menor dúvida de que “Fuga sem destino” seria o seu melhor filme. Tanto que, embora não tenha vivido o suficiente para ver o longa-metragem nas telas, deu as últimas indicações de como ele deveria concluído do seu leito de morte.

— Criei para ele a marca de “o pior cineasta do mundo”. Achei que seria um bom marketing, e realmente deu certo. Mas ele dizia que não a usaria mais não, porque este seria o seu melhor filme — conta o amigo, ator e também diretor Pedro Lacerda, encarregado por Brazza de pôr o ponto final em “Fuga sem destino”.

O cineasta-bombeiro de Brasília foi um diretor realmente independente. Discípulo de Tony Vieira (1938-1990), o rei do bangue-bangue da Boca do Lixo — por sinal, casou-se com Claudete Joubert, a viúva dele — escreveu, produziu, dirigiu, montou e estrelou mais sete filmes de ação além de “Fuga”: “Procurador Jefferson, matador de escravos” (1982), “Os Navarros” (1985), “Santhion nunca morre” (1987), “Inferno no Gama” (1993), “Gringo não perdoa, mata” (1995), “No eixo da morte” (1998) e “Tortura selvagem — A grade” (2000).

Brazza foi pego de surpresa por um câncer no esôfago, que o matou em menos de um mês depois de diagnosticado, aos 48 anos, no dia 29 de julho, às 20h15m. Poucas horas antes, pediu para um amigo, no hospital, que anotasse as suas últimas instruções e as passasse para Lacerda.

— Naquele dia, fiquei com ele até as 17h — conta Lacerda. — Ele estava muito fraco, não conseguia mais andar. Tinha deixado o filme pré-montado em São Paulo. A gente está finalizando, mas seguindo o estilo e as instruções dele.

Lacerda sabe que a missão é das mais complicadas: “Meu sistema de roteiro é muito doido. Ele serve só de guia. Quando vou filmar, mudo tudo.”, dizia Brazza, a respeito de seu método peculiar de filmar. Para complicar ainda mais, seus filmes, em plena era do som direto, ainda eram dublados.

— Ele deixou uma lista de diálogos, mas não fazia nem um som guia. Estava tudo na cabeça dele — explica Lacerda. — Começamos pelos tiros, que são mais de 200!

Brazza será homenageado no Festival de Brasília

Nos últimos filmes, Brazza foi dublado pelo ator Antônio Moreno, e sua musa, Claudete, como sempre por Rosa Maria (sua voz desde os tempos da Boca do Lixo). Em “Fuga sem destino” — que tem a participação especial de Frank Aguiar — ele interpreta um ex-pistoleiro que é chantageado para voltar à ativa. A história, como sempre, termina em banho de sangue.

— Os filmes dele eram sempre uma variação sobre o mesmo tema, mas neste, pela primeira vez, ele beija a mocinha no fim — diz Lacerda. — É um beijo longo e triste, como uma despedida, quase profético.

Lacerda agora corre contra o tempo. A data de estréia de “Fuga” já está marcada: dia 28 de novembro, no Festival de Brasília, quando Brazza será homenageado. Ele esteve na semana passada na Riofilme, tentando conseguir o dinheiro que falta para concluir o filme.