18.10.01

TITÃS FAVELADOS

Nada melhor do que iniciar o blog com a volta aos palcos dos Titãs, na boca da favela do Complexo do Alemão, em Inhaúma, no domingo. O palco foi montado num campo de futebol de terra batida, o Campo do Sargento. As laterais são demarcadas de um lado por um pequeno morro e do outro por um córrego por onde corre um filete de esgoto, facilmente ultrapassado, mas que conta com a ajuda de uma ponte improvisada.

Logo de cara, os caras mandaram a nova “Vamos ao Trabalho”, que lembra os bons tempos do “Cabeça Dinossauro”. Na seqüência, “Aluga-se”, “Polícia” e “Lugar Nenhum” pra deixar a galera mais perdido que afegão em bombardeio. A bola baixou com as músicas do irregular disco novo e as baladas acústicas. “Pra Dizer Adeus” virou homenagem a Marcelo Fromer. Antes de começarem um novo bombardeio, jogaram “Comida” (na levada acústica). Como um pastor evangélico, Nando Reis exorcizou a galera mandando “Jesus não tem dentes no país dos banguelas” e “Nome aos bois” (começo idêntico do ao vivo “Go Back”). Branco Mello desenterrou “Tô Cansado”. No bis, “Nem Cinco Minutos Guardados” foi suprimida para o gran finale “Flores”.

Tão interessante quanto o show foi sentir a reação da galera da comunidade. Segundo o Globo On line 20 mil pintaram por lá. Exagero, não tinha nem a metade disso. A maioria absoluta sem condições de assistir a um show na Barra ou em Botafogo pagando 30 pratas pelo ingresso. Apesar de anunciado no JB e no Globo, o público mauricinho que freqüenta os shows dos Titãs desde o “Acústico” não deu as caras. Será que faltou coragem para encarar uma ida à favela? Ou não voltaram a tempo do feriadão de Búzios?

A preferência dos adolescentes pelas roupas vermelhas não é coincidência. Lá no Complexo do Alemão quem domina é o Comando Vermelho. Sorte que meu Chevete é da cor da Ferrari. Chegou a rolar um tiroteiozinho básico ao fundo, facilmente abafado pelo som. Uma galera dava mosh em frente ao palco, mas nem sinal de roda punk, muito menos do corredor lado B/lado A. Muitos só olhavam, com cara de mau, fazendo pose de MV Bill. Alguns funkeiros devem ter achado Bonde do Tigrão bem melhor que os Titãs. Quando Nando Reis leu um poema para Fromer, um cara perguntou pra outro: “De quem que ele tá falando?”. “Sei lá, deve ser um cara que morreu no atentado dos Estados Unidos”.

Mas alguns atos isolados me chamaram a atenção. Deu gosto de ver meia dúzia de criancinhas fazendo trenzinho no “Pulso”, como se estivessem num baile funk, e garotinhas saltitantes ao som de “Flores”. E o mais engraçado foi notar uma família de evangélicos embasbacada com “Jesus Não Tem Dentes...” e sem reação nos palavrões de “Será que é isso que eu necessito?”. Se rolasse “Igreja”, eles certamente chamariam o pastor para pregarem contra os Titãs. Essa galera merece mais do que Bonde do Tigrão.